Texto escrito por Bruno Strapasson
A Análise do
Comportamento é uma disciplina científica dedicada ao estudo das interações
entre organismo e ambiente no nível comportamental. Inspirada originalmente na
obra de B. F. Skinner (1904-1990) essa ciência evolui e se expande desde sua
proposição (Skinner, 1945/1984) até os dias de hoje. Atualmente, com o
reconhecimento mundial na eficácia do tratamento do autismo e com um corpo
crescente de pesquisas permitindo intervenções comportamentais baseadas em
evidências, a Análise do Comportamento tem cada vez mais se consolidado dentre
as diversas disciplinas interessadas direta ou indiretamente em fenômenos e
processos comportamentais. Os encontros e jornadas de Análise do Comportamento
se multiplicam pelo Brasil e as principais associações da área (Association
for Behavior Anaysis International – ABAI; Associação Brasileira de
Psicologia e Medicina Comportamental; Associação Brasileira de Análise do
Comportamento), crescem a cada ano.
Entretanto,
entre a formulação original dessa disciplina e a crescente aceitação nos dias
atuais houve um difícil e tortuoso caminho. Desde a década de 50 do século XX
os analistas do comportamento tiveram dificuldades em encontrar espaço para
publicação dos seus estudos, que utilizavam metodologia de pesquisa de sujeito
único, e tiveram que criar seus próprios veículos de publicação (o Journal
of the Experimental Analysis of Behavior e o Journal of Applied Behavior
Analysis surgiram assim). Além disso, nas décadas seguintes, o vocabulário
técnico específico, a rejeição ao mentalismo e, com esta última, o afastamento
do diálogo com outras proposições teóricas e com disciplinas afins, colocaram a
Análise do Comportamento numa situação de isolamento em relação às demais
ciências do comportamento (ver Krantz, 1971 e Coleman & Mehlman, 1992).
Junte-se a isso os frequentes mal entendidos em relação à Análise do
Comportamento e as repetidas críticas infundadas direcionadas a essa ciência
(ver Carrara, 2005) e será fácil compreender por que as contribuições da Análise
do Comportamento para a compreensão dos fenômenos e processos comportamentais
não foram rapidamente assimiladas e disseminadas na comunidade científica e
leiga.
Tais
dificuldades não ocorreram a esmo - durante tempo considerável de nossa
história parte das tecnologias derivadas de princípios comportamentais foram
aplicadas de modo simplista e pouco contextualizado pelos chamados
“modificadores do comportamento” e as intervenções que se popularizaram
acabaram reduzidas a técnicas específicas como a dessensibilização sistemática,
ignorando assim boa parte das prescrições mais importantes da Análise do
Comportamento: a realização de análises contextualizadas e com previsão de
manutenção e generalização. Parece, portanto, que problemas de comunicação acadêmica
e divulgação científica dificultaram fortemente a disseminação apropriada da
Análise do Comportamento.
Em Curitiba
o seu desenvolvimento não parece ter sido muito diferente. O ensino da Análise
do Comportamento iniciou junto com os cursos de Psicologia da cidade e, em seus
primórdios, replicou a postura excessivamente crítica (em oposição ao incentivo
ao diálogo), em relação às outras proposições, e tecnicista (focando mais na
aplicação de técnicas do que em análises comportamentais mais amplas) comum em
meados do século passado no resto do mundo. Apenas aos poucos a Análise do
Comportamento na cidade vem se tornando consciente da necessidade de aplicação
de seus princípios de forma ampla e rigorosa e hoje já se goza de maior
respeitabilidade, avançando significativamente na produção de conhecimento e em
intervenções mais eficazes e eficientes. Contudo, sofremos ainda com uma
formação limitada e um investimento demasiado tímido na comunicação e
divulgação científica.
A Análise do
Comportamento na cidade conta hoje com muitos âmbitos de ensino. Além das
disciplinas de graduação, temos institutos de formação, cursos de
especialização e dois mestrados com orientadores analistas do comportamento.
Entretanto, nos cursos de graduação é raro encontrar professores dispostos a
orientar estágios em áreas que não sejam clínicas, dificultando o
desenvolvimento de habilidades dos alunos relacionadas a campos de atuação
alternativos, como na área da saúde pública, na educação, no trabalho ou na
pesquisa básica. O mesmo problema se repete nos cursos de formação e
especialização e, na pós-graduação stricto sensu, apesar de existirem
hoje dois programas de mestrado com analistas do comportamento como
orientadores (mestrado em Psicologia da UFPR e de mestrado em Psicologia
Forense e Comunitária da Universidade Tuiuti do Paraná), em nenhum desses
programas há linhas específicas de Análise do Comportamento. Quando se pensa em
divulgação científica estamos também bastante tímidos. Poucas são as aparições
de analistas do comportamento na mídia em geral e poucos são os veículos de
divulgação direcionados ao público leigo que já publicaram textos de analistas
do comportamento.
Por outro
lado, apesar dessas condições vigentes, o prognóstico parece ser favorável ao
desenvolvimento da Análise do Comportamento na cidade. Em observação
assistemática, arrisco dizer que cada vez mais aumenta a proporção e qualidade
dos analistas do comportamento que se formam nos cursos de graduação. Além
disso, cada ano aumenta o número de analistas do comportamento que terminam
suas formações stricto sensu, seja nos programas locais (que começam a
formar seus primeiros mestres), seja investindo em sua formação em outros
centros de excelência pelo país. Professores da cidade se destacam no cenário
nacional da psicologia, tanto tornando-se referência em âmbitos específicos do
conhecimento em Análise do Comportamento, como assumindo posições de destaque
em organizações de representação da psicologia, como a Sociedade Brasileira de
Psicologia, por exemplo. E os cursos de formação e especialização em Análise do
Comportamento, ainda que um tanto restritos em termos de abrangência de campos
de atuação, crescem em quantidade e qualidade, demonstrando que há demanda
também crescente para o aprimoramento da formação.
Falta-nos
hoje um investimento maior na divulgação científica, na formação de
profissionais capazes de intervir consistentemente em variados contextos
profissionais e dispostos a dialogar com disciplinas afins. Nesse contexto,
organizações acadêmicas de alunos podem exercer papel significativo no
desenvolvimento da Análise do Comportamento, o que pode ocorrer por meio de
diversas ações: ajudar no direcionamento da formação de alunos com grupos de
estudos ou na organização de cursos rápidos; na realização de eventos que
possam ajudar tanto na atualização em temas de interesse como na divulgação
científica; na integração de alunos de diferentes instituições; ou mesmo na
criação de outras contingências que favoreçam a sobrevivência de práticas
culturais eficientes para a resolução de problemas humanos por meio do emprego
da Análise do Comportamento. É confiando nesse potencial das organizações
acadêmicas que vejo com muito bons olhos a criação da Liga Acadêmica Curitibana
de Análise do Comportamento. Espero que iniciativas como essa se multipliquem e
se consolidem na cidade e no Brasil.
Referências
Carrara, K. (2005). Behaviorismo Radical: Crítica e metacrítica. São Paulo: EDUnesp
Coleman, S. R. & Mehlman, S. E. (1992).
An Empirical Update (1969-1989) of D. L. Krantz's Thesis That the Experimental
Analysis of Behavior is Isolated. The Behavior Analyst, 15, 43-49.
Krantz, D. L. (1971). The separate worlds of
operant and nonoperant psychology. Journal of Applied Behavior Analysis, 4,
61-70.
Skinner, B. F. (1984). Operational analysis
of psychological terms. Behavior and Brain Sciences, 7, 547-553
(trabalho originalmente publicado em 1945).
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