LAC-AC

LAC-AC: Liga Acadêmica Curitibana de Análise do Comportamento

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Situações e dificuldades da Análise do Comportamento em Curitiba

Texto escrito por Bruno Strapasson

A Análise do Comportamento é uma disciplina científica dedicada ao estudo das interações entre organismo e ambiente no nível comportamental. Inspirada originalmente na obra de B. F. Skinner (1904-1990) essa ciência evolui e se expande desde sua proposição (Skinner, 1945/1984) até os dias de hoje. Atualmente, com o reconhecimento mundial na eficácia do tratamento do autismo e com um corpo crescente de pesquisas permitindo intervenções comportamentais baseadas em evidências, a Análise do Comportamento tem cada vez mais se consolidado dentre as diversas disciplinas interessadas direta ou indiretamente em fenômenos e processos comportamentais. Os encontros e jornadas de Análise do Comportamento se multiplicam pelo Brasil e as principais associações da área (Association for Behavior Anaysis International – ABAI; Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental;  Associação Brasileira de Análise do Comportamento), crescem a cada ano.
Entretanto, entre a formulação original dessa disciplina e a crescente aceitação nos dias atuais houve um difícil e tortuoso caminho. Desde a década de 50 do século XX os analistas do comportamento tiveram dificuldades em encontrar espaço para publicação dos seus estudos, que utilizavam metodologia de pesquisa de sujeito único, e tiveram que criar seus próprios veículos de publicação (o Journal of the Experimental Analysis of Behavior e o Journal of Applied Behavior Analysis surgiram assim). Além disso, nas décadas seguintes, o vocabulário técnico específico, a rejeição ao mentalismo e, com esta última, o afastamento do diálogo com outras proposições teóricas e com disciplinas afins, colocaram a Análise do Comportamento numa situação de isolamento em relação às demais ciências do comportamento (ver Krantz, 1971 e Coleman & Mehlman, 1992). Junte-se a isso os frequentes mal entendidos em relação à Análise do Comportamento e as repetidas críticas infundadas direcionadas a essa ciência (ver Carrara, 2005) e será fácil compreender por que as contribuições da Análise do Comportamento para a compreensão dos fenômenos e processos comportamentais não foram rapidamente assimiladas e disseminadas na comunidade científica e leiga.
Tais dificuldades não ocorreram a esmo - durante tempo considerável de nossa história parte das tecnologias derivadas de princípios comportamentais foram aplicadas de modo simplista e pouco contextualizado pelos chamados “modificadores do comportamento” e as intervenções que se popularizaram acabaram reduzidas a técnicas específicas como a dessensibilização sistemática, ignorando assim boa parte das prescrições mais importantes da Análise do Comportamento: a realização de análises contextualizadas e com previsão de manutenção e generalização. Parece, portanto, que problemas de comunicação acadêmica e divulgação científica dificultaram fortemente a disseminação apropriada da Análise do Comportamento.
Em Curitiba o seu desenvolvimento não parece ter sido muito diferente. O ensino da Análise do Comportamento iniciou junto com os cursos de Psicologia da cidade e, em seus primórdios, replicou a postura excessivamente crítica (em oposição ao incentivo ao diálogo), em relação às outras proposições, e tecnicista (focando mais na aplicação de técnicas do que em análises comportamentais mais amplas) comum em meados do século passado no resto do mundo. Apenas aos poucos a Análise do Comportamento na cidade vem se tornando consciente da necessidade de aplicação de seus princípios de forma ampla e rigorosa e hoje já se goza de maior respeitabilidade, avançando significativamente na produção de conhecimento e em intervenções mais eficazes e eficientes. Contudo, sofremos ainda com uma formação limitada e um investimento demasiado tímido na comunicação e divulgação científica.
A Análise do Comportamento na cidade conta hoje com muitos âmbitos de ensino. Além das disciplinas de graduação, temos institutos de formação, cursos de especialização e dois mestrados com orientadores analistas do comportamento. Entretanto, nos cursos de graduação é raro encontrar professores dispostos a orientar estágios em áreas que não sejam clínicas, dificultando o desenvolvimento de habilidades dos alunos relacionadas a campos de atuação alternativos, como na área da saúde pública, na educação, no trabalho ou na pesquisa básica. O mesmo problema se repete nos cursos de formação e especialização e, na pós-graduação stricto sensu, apesar de existirem hoje dois programas de mestrado com analistas do comportamento como orientadores (mestrado em Psicologia da UFPR e de mestrado em Psicologia Forense e Comunitária da Universidade Tuiuti do Paraná), em nenhum desses programas há linhas específicas de Análise do Comportamento. Quando se pensa em divulgação científica estamos também bastante tímidos. Poucas são as aparições de analistas do comportamento na mídia em geral e poucos são os veículos de divulgação direcionados ao público leigo que já publicaram textos de analistas do comportamento.
Por outro lado, apesar dessas condições vigentes, o prognóstico parece ser favorável ao desenvolvimento da Análise do Comportamento na cidade. Em observação assistemática, arrisco dizer que cada vez mais aumenta a proporção e qualidade dos analistas do comportamento que se formam nos cursos de graduação. Além disso, cada ano aumenta o número de analistas do comportamento que terminam suas formações stricto sensu, seja nos programas locais (que começam a formar seus primeiros mestres), seja investindo em sua formação em outros centros de excelência pelo país. Professores da cidade se destacam no cenário nacional da psicologia, tanto tornando-se referência em âmbitos específicos do conhecimento em Análise do Comportamento, como assumindo posições de destaque em organizações de representação da psicologia, como a Sociedade Brasileira de Psicologia, por exemplo. E os cursos de formação e especialização em Análise do Comportamento, ainda que um tanto restritos em termos de abrangência de campos de atuação, crescem em quantidade e qualidade, demonstrando que há demanda também crescente para o aprimoramento da formação.
Falta-nos hoje um investimento maior na divulgação científica, na formação de profissionais capazes de intervir consistentemente em variados contextos profissionais e dispostos a dialogar com disciplinas afins. Nesse contexto, organizações acadêmicas de alunos podem exercer papel significativo no desenvolvimento da Análise do Comportamento, o que pode ocorrer por meio de diversas ações: ajudar no direcionamento da formação de alunos com grupos de estudos ou na organização de cursos rápidos; na realização de eventos que possam ajudar tanto na atualização em temas de interesse como na divulgação científica; na integração de alunos de diferentes instituições; ou mesmo na criação de outras contingências que favoreçam a sobrevivência de práticas culturais eficientes para a resolução de problemas humanos por meio do emprego da Análise do Comportamento. É confiando nesse potencial das organizações acadêmicas que vejo com muito bons olhos a criação da Liga Acadêmica Curitibana de Análise do Comportamento. Espero que iniciativas como essa se multipliquem e se consolidem na cidade e no Brasil.

Referências
Carrara, K. (2005). Behaviorismo Radical: Crítica e metacrítica. São Paulo: EDUnesp 
Coleman, S. R. & Mehlman, S. E. (1992). An Empirical Update (1969-1989) of D. L. Krantz's Thesis That the Experimental Analysis of Behavior is Isolated. The Behavior Analyst, 15, 43-49.    
Krantz, D. L. (1971). The separate worlds of operant and nonoperant psychology. Journal of Applied Behavior Analysis, 4, 61-70.
Skinner, B. F. (1984). Operational analysis of psychological terms. Behavior and Brain Sciences, 7, 547-553 (trabalho originalmente publicado em 1945).




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