Texto escrito por Roberto Veloso (Presidente LAC-AC)
Então você pensava que pesquisar é coisa de cientistas malucos, vestidos em
jalecos empoeirados, que não dormem direito e que se esquecem de pentear o
cabelo? Bem, pode até ser verdade, mas é só parte verdade, porque todo mundo
pesquisa. Isso mesmo, pesquisar não é algo que se faz apenas em laboratórios,
mas principalmente no cotidiano.
Estamos pesquisando constantemente. Desde os primeiros anos de vida
quando começamos a procurar por aquele brinquedo que o tio babão escondeu atrás
da mão, bem diante dos nossos olhos, passando pela busca pela batida perfeita e
até a pesquisa por aquela fulana de tal que estava te olhando assim no bar,
ontem. Tudo isso é, em alguma medida, pesquisar.
Se pesquisar é uma atividade tão comum no dia a dia, por que, então, ela
se tornou tão importante, tão cheia de glamour, tão…científica? As
pesquisas científicas receberam, nos últimos séculos, grande atenção por terem
nos proporcionado talvez as maiores descobertas da humanidade, depois do fogo,
da roda e do café, claro. Foi através de pesquisa científica que descobrimos os
medicamentos anti-inflamatórios que salvaram tantas pessoas e permitiram um
avanço gigantesco na Medicina. Foi através de pesquisa científica que
descobrimos como fazer uma pessoa chegar até a Lua (sem entrar no mérito da
questão sobre já termos feito isso ou não). E foi através da pesquisa
científica que descobrimos que doenças mentais não são causadas por espíritos
malignos, tal como se acreditava na Idade Média.
Acho engraçado pensar que a mesma atividade (pesquisar) que produziu
tantas consequências maravilhosas para a humanidade foi pouco eficiente a me
levar a encontrar o outro par da minha meia. Piadas à parte, não é a mesma
atividade. Ou será que é? Existe, evidentemente, uma diferença entre a pesquisa
científica e a pesquisa que fazemos no Google, por exemplo. Mas o que as
distingue?
Talvez essa diferença tenha começado quando uma pessoa perguntou à outra
“mas como você fez para achar isso?” e essa outra respondeu, com a digna
expressão da sabedoria do momento, “foi assim, assim, e assim”, de maneira que
quando a primeira fez assim, assim, e assim, também conseguiu achar o “isso” em
questão. E desde que houve sucesso em achar esse tal de “isso”, a gente começou
a prestar atenção em como as pessoas resolviam as coisas, até um dia em que
alguém percebe que tinha um problema para resolver, mas não sabia como. Não
tinha ninguém para lhe ensinar a agir “assim, assim, e assim” de maneira a
resolver seu problema. Esse infortunado teve, no fim das contas, de descobrir
por si mesmo. Teve que pesquisar.
A ciência pode até não ter começado assim, mas essas situações ilustram
um princípio importante na pesquisa científica: você precisa organizar as
coisas. Se sair procurando aleatoriamente por aí, olhando o que lhe aparece
pela frente conforme a sorte lhe apresenta os fatos, talvez até encontre, mas
dificilmente esse seria um método muito eficiente. Pesquisar envolve organizar
tudo o que você tem a sua disposição.
Contudo, antes de começar a se organizar, outro passo é importante:
definir o que quer encontrar. Não é preciso saber a resposta para o problema
que procura, veja bem. Seria loucura procurar o que já se sabe. O que é preciso
é delimitar bem o problema. Quanto mais específica for sua delimitação, melhor
preparado você estará para encontrar o que procura. Perceba, por exemplo, a
diferença entre pesquisar “um jeito de chegar lá” e pesquisar “o melhor caminho
para ir até o estádio de futebol mais perto da sua casa”. Essa delimitação
precisa faz toda a diferença.
Parece que não fica tão difícil agora aplicar esse princípio da pesquisa
científica ao cotidiano. Se eu tenho um problema para o qual necessito de
alguma solução, o primeiro passo é conseguir delimitar o problema de maneira
precisa. Isso vale tanto para você que tem que descobrir como poupar melhor seu
dinheiro quanto para você que quer lidar melhor com seus colegas.
Depois de delimitar precisamente o problema, como já disse, sair
procurando em qualquer lugar é contar com a sorte: organize sua pesquisa!
Existem formas mais eficazes para lidar com determinadas situações. Algumas
estratégias funcionam melhor para alguns problemas e algumas funcionam melhor
para outros. Se sua namorada se acalma com chocolate e sua mãe com flores,
talvez não seja tão eficaz mandar flores para a namorada brava e chocolate para
a mãe furiosa.
Existem centenas de manuais descrevendo dezenas de estratégias para
utilizar em pesquisa científica e seria insensatez tentar apresentá-las aqui.
Futuramente quem sabe a gente conversa sobre algumas delas - as mais comuns,
talvez. Ao invés disso, há uma observação mais útil: a delimitação do problema
já te dá uma boa dica de qual estratégia usar para resolvê-lo.
Se você quer saber quantas pessoas moram em Curitiba, talvez não seja
uma boa estratégia sair contando todo mundo que você vê pelas ruas quando
passeia pela cidade. Uma estratégia melhor seria procurar no banco de dados do
IBGE. E lembra aquela minha meia perdida? Eu não consegui encontra-la em lugar
nenhum, nem debaixo da cama nem no sapateiro; parecia que tinha sido abduzida
por alienígenas... Até que eu procurei na gaveta de meias.
Em resumo: (1) não saia procurando em qualquer lugar, (2) planejamento
evita desperdiçar tempo e (3) atente-se para sua delimitação do problema de
pesquisa, pois ele te indicará a melhor forma de resolvê-lo.
Um terceiro e último aspecto da pesquisa científica que gostaria de
relacionar ao nosso cotidiano é o que fazemos quando conseguimos completar uma
investigação com sucesso: nós eventualmente ficamos felizes pelo resultado... E
só! Por outro lado, os cientistas, quando terminam uma pesquisa, registram tudo
com muito cuidado e publicam em uma revista específica. Chique, não? Nem tanto,
ou melhor, não por isso. O objetivo dessa publicação é informar à comunidade o
que foi descoberto e como foi descoberto. Assim todas as pessoas poderão se
beneficiar não apenas daquele novo conhecimento como também daquela forma de
consegui-lo.
É bom notar que não estou sugerindo a ninguém sair contando para todo mundo o que acabou de descobrir (eu mesmo não saí contando para ninguém que encontrei meu par de meia na devida gaveta... não até escrever este texto ao menos). O que quero sugerir é compartilhar como nós chegamos as nossas descobertas. Esse tipo de conhecimento, no cotidiano, pode muito facilitar a vida de nossos parentes, colegas e até funcionários. É o que faz, ouso dizer, a cultura humana crescer.